sábado, 19 de novembro de 2011

Animador Vocacional : Somente tu...


A fé do animador vocacional nunca deve se abater diante do reduzido número de vocacionados, pois Deus chama quem ele quer e o segue quem de fato se compromete com Cristo



Encontramo-nos em uma grande paróquia, no começo da missa de domingo, com o padre já no altar e com a presença de vários fiéis. De repente entram na Igreja dois homens com roupa  escura, encapuzados, armados. Dois terroristas, talvez kamikazes, daqueles que não pensam duas vezes para explodir uma bomba e ao mesmo tempo serem jogados no ar com outras pessoas. Um dos dois começa a gritar: “Quem está disposto a receber uma bala por amor de Cristo? Afinal, quem acredita nele fique no lugar onde está. Os outros saiam da Igreja!”. Ninguém quer ouvir aquela proposta uma segunda vez. Devido ao pânico, a maior parte dos fiéis sai correndo. Daquele grande grupo de fiéis (?) permanecem na Igreja somente umas vinte pessoas crentes, cada um rezando para a sua alma. O homem que gritou, tira o capuz, olha para o padre imóvel no altar (talvez se tivesse sido possível ele também teria logo fugido) e diz: “Muito bem! Libertei o senhor de todos os hipócritas. Agora pode iniciar sua missa. Adeus”. E com muita calma os dois homens saem da Igreja. Inacreditável, não é? Mas a história, criada pela imaginação, quer somente fazer uma reflexão a respeito da hipocrisia de uma determinada maneira de crer, de participar da liturgia, da oração, do testemunho da própria fé e, talvez, do trabalho de um animador da juventude. Você, que está lendo, o que teria feito?

“Não quereis também vós partir?”

Talvez nem seria necessário construir mais uma historinha: o próprio Jesus, no evangelho, não ficou com medo de encontrar- se sozinho, com poucos seguidores. Aliás, quando fez aquele discurso estranho a respeito do pão da vida, e viu muitos dos seus discípulos o abandonarem, com um tom perigosamente provocatório desafiou Pedro e os demais apóstolos a irem também eles embora. Pois bem, nos dias atuais ninguém nos mataria com uma bala porque acreditamos em Cristo - pelo menos em nossa sociedade ocidental. Mas é esta a perseguição sutil e rastejante dos nossos dias: a sensação, algo até desesperador, de sermos poucos e insignificantes, como se fôssemos impotentes diante de uma cultura que nos contraria. E assim surge a tentação da incoerência: diminuir os questionamentos e a responsabilidade, gostar da opressão.  Com certeza, Jesus não fez isso. 

“A quem iremos?”

Um animador vocacional  interpreta os dois papéis: é como um mestre (com seus  vocacionados) e, ao mesmo tempo, é um discípulo (em relação a Jesus). Se quiser fazer bem o primeiro papel, deve fazer bem também o segundo, isto é, ser um bom discípulo. Assim como foi Pedro. Ele  decidiu seguir o Mestre, não porque “compreendeu” o discurso a respeito do pão da vida, e nem porque Jesus multiplicou os pães, mas porque esse Mestre é único. Ao invés dele acolher a ambígua, mas atraente, aclamação do povo saciado, começa a dizer coisas difíceis e duras, que tornam possível aquele questionamento. Jesus não é como outros mestres, que fazem milagres
sensacionais junto aos seus (para ter audiência) e depois pronunciam palavras banais e sem valor, sem nenhum apego à vida eterna, sem o respiro do mistério, sem a força de acabar com a hipocrisia. No Mestre Jesus há algo diferente e novo, que satisfaz e inquieta, que doa e pede o máximo. E Pedro, o pescador, entende que somente seguindo esse homem poderá descobrir e realizar a si mesmo. Não sabe como, mas percebe que é desta forma... 

“Somente tu tens palavras de vida eterna...”

Como é bela a expressão: “Somente tu”! Significa a unicidade e a singularidade absoluta do Verbo feito homem. Somente Jesus - é a intuição de Pedro -, poderá dizer a verdade e manifestar o mistério.  Não é a única vez no evangelho que aparece esta expressão em seu significado mais profundo. No episódio dos guardas que foram enviados para capturar Jesus, eles ficaram encantados, ouvindo-o, porque, como afirmaram: “Nunca alguém falou como esse homem” (Jo 7,46). Também neste caso notamos tratar-se de pessoas simples, mas que sabem captar de imediato a palavra que responde às exigências profundas do coração humano.
Jesus encanta com suas palavras de vida eterna, não porque fala da vida futura, mas porque o que ele diz nasce do amor e contém vida. E um ato de amor verdadeiro, de  fato, é para sempre, dura eternamente. Dizer a uma pessoa: “Eu te quero bem”, é como lhe dizer: “Não vais morrer”. É palavra de vida eterna! Palavra forte, definitiva, que fixa a dignidade do “tu” de modo irrevogável e torna inútil cada referência aos outros, a outras palavras, a outros messias. Assim “fala” Jesus. E por isso a pessoa o segue, devido a essa sede de eternidade satisfeita. E se o Cristo é experimentado como o único que possui as palavras de vida, então o seguimento comporta uma certa solidão. É como duas solidões, em parâmetros diferentes, que se procuram, criando um relacionamento mais forte do que a morte. 

“...e nós acreditamos”

A fé possui uma dimensão naturalmente comunitária, mas é um gesto e uma decisão da pessoa em particular. Esta é a fé que se deve compartilhar e fazer crescer em cada um dos vocacionados e vocacionadas. Assim nasce o grupo, não o contrário, mesmo sabendo que a participação grupal pode ajudar o caminho da pessoa particular que crê. É importante prestar atenção para que o grupo paroquial não viva em função das necessidades psicológicas de seus membros. Uma espécie de grupo “pronto socorro psicológico”, no qual cada um deve necessariamente agradar ao outro, e onde alguns “corações solitários” parecem estar
em perene procura da alma gêmea (isto é, de si mesmo, na realidade). Ou o grupo paroquial se transforme em um mix, ou seja, um ponto de encontro (agradável aos pais) entre a danceteria e a sombra da igreja, onde a diversão evita determinados excessos... A fé não pode tornar-se um calmante para jovens de famílias tradicionais, e nem o grupo virar uma manada em que se perde a individualidade e a coragem de escolher, no qual uma pessoa pensa por todos e ninguém mais corre o risco de acreditar. Onde todos fugiriam diante da perspectiva do martírio, ou do testemunho radical e forte frente a uma cultura hostil. Então, o animador da juventude deve ter a coragem de derrubar a hipocrisia, como os dois homens encapuzados da historinha relatada no início do texto, mas sem nenhuma máscara, pelo contrário, mostrando no rosto a alegria de quem segue a Jesus Cristo, o único que tem palavras de vida, da vida plena e para sempre! Mesmo quando há um preço a ser pago, que não será nunca totalmente quitado... 

Revista Rogate—Junho/Julho de 2010. pp.30


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