sexta-feira, 27 de maio de 2011

SHALOM



Quando eu estava em Roma escrevendo a minha tese, devia fazer uma análise do termo hebraico “Shalôm”. Não estava contente com as explicações dadas pelos dicionários, que em geral traduziam o termo por “Paz”. Por isso, fui procurar um rabino hebreu, que muito carinhosamente me recebeu.

- Falar de Shalôm é algo muito importante... – disse-me ele – é um dos termos hebraicos mais carregados de sentido e força que temos em nossa língua. É certo que traduzir simplesmente por “Paz” empobrece muito o sentido da palavra original.

Enquanto ele falava, calmamente, pegou um copo e tomando uma jarra de água, foi colocando no copo muito devagar, deixando soar o borbulhar da água. O copo foi enchendo, equando mais chegava perto da borda ele ia cuidadosamente derramando ainda água...

- Veja bem, não cabe mais nada. Nem uma gota de água neste copo. Se eu colocar mais, vai derramar, vai transbordar. É quando tudo está completo, é a plenitude. Está me entendendo?

Balancei a cabeça em sentido negativo, olhando para o copo cheio de tal modo que nãocoubesse mais nada.

- O Shalôm é isso, irmão meu. É o máximo que pode caber. Quando eu desejo um Shalôm a alguém, eu desejo todo o bem, tudo de bom, tanto bem que mais do que isso é impossível desejar.

Sinal da quitação, quando não existe nada mais a pagar. Estás entendendo?
- Sim, agora entendi o que é o Shalôm!
- Não ainda, irmão meu. Para entender bem o sentido do Shalôm é preciso receber o Shalôm; é preciso ter o Shalôm... Posso ver em você perturbações, conflitos internos... Para você ter o Shalôm é preciso que você tenha a harmonia interna, que você equilibre dentro de você as forças,
que se sinta bem, que você esteja em harmonia consigo mesmo, que esteja em paz...
- Agora entendi...

- Ainda não... Você não está sozinho neste mundo. Você convive com pessoas. As pessoas são importantes na nossa vida. E devemos estar em relação de harmonia com elas. Harmonizar-se com as pessoas que estão perto de nós; harmonizar-se com as pessoas que amamos e queremos bem; harmonizar-se com as pessoas que não gostamos e que às vezes nos fazem mesmo o mal; harmonizar-se com as pessoas que estão longe; harmonizar-se com as pessoas que necessitam de paz, de ajuda, que vivem em dificuldades, que são excluídas, que passam fome, dor, solidão... Quando nos harmonizamos com as pessoas então sim temos o Shalôm.

- Entendi...
- Mais um pouco... Não estamos sozinhos no mundo. Vivemos rodeados pelas criaturas de Deus. Você está sentindo a cadeira onde está sentado? Sente o chão onde firma os seus pés? Sente o ar que está respirando? Escute! Aposto que não está ouvindo a beleza do canto do passarinho, o cachorro que late, o grito da vida e da natureza, a suavidade do vento... Estar em harmonia com a Criação, com as criaturas, com a vida... Isso é também ter o Shalôm.

- Agora estou entendendo...
- Tenha ainda um pouco de paciência. Irmão meu, você é uma criatura, não o Criador. Como um ser criado, você deve estar em harmonia constante com Deus. O Deus que te amou, e que pensou em ti no momento da Criação. Para ter o verdadeiro Shalôm, você deve estar em sintonia e em plena harmonia com Deus, nosso Criador... Harmonize a tua vida com Ele, deixe que Ele guie os teus passos. E então terás o Shalôm.

- Acho que nunca vou entender o que é o Shalôm...
- Não, agora você começou a entender o verdadeiro sentido desta expressão hebraica. Nenhuma palavra das línguas modernas pode traduzir toda a força e o conteúdo do Shalôm da nossa língua mãe. Mas só quando conseguirmos harmonizar dentro de nós estas quatro dimensões é que poderemos dizer que temos o Shalôm; só então é que poderemos desejar verdadeiramente um Shalôm. Estar como um copo cheio onde não cabe mais nada; deixar o outro como um copo repleto.

E me abraçando, olhando-me nos olhos, e então desejou-me um Shalôm...

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Irmã Dulce: uma vida de caridade e doação sem medidas


Pedro Teixeira

Esta é uma semana especial para os católicos no Brasil, que aguardam a beatificação de mais uma brasileira. Na terceira reportagem da série “O Anjo Bom do Brasil” veja a flor que se tornou o centro das atenções na Obra Social Criada por irmã Dulce.
Chama-se "Amor Perfeito", essa planta européia, que não exige muitos cuidados e floresce na maior parte do ano. Em 2006, uma flor em especial chamou a atenção de dona Iraci por se parecer demais com Irmã Dulce.
Em pouco tempo o assunto se espalhou entre os devotos. Para eles, um sinal de santidade da irmã.
A santidade de Irmã Dulce nunca foi questionada por quem a conheceu de perto. Para muitos, era só uma questão de tempo.
Irmã Dulce sofria de efizema pulmonar, o que comprometeu 70% de sua capacidade respiratória. Faleceu em 1992. Salvador parecia mergulhar em profunda desolação. 
Capela do convento de Santo Antônio. A devota Evanildes de França se emociona diante do local onde a partir de 2000 passou a ficar o túmulo de Irmã Dulce. A estudante de enfermagem havia descoberto que estava com câncer no útero.
O túmulo permaneceu na capela durante dez anos, foi novamente transladado, desta vez para a Capela das Relíquias, onde se encontra atualmente. 
Não são poucas as histórias de graças alcançadas. Os devotos deixam bilhetes amarrados em fitas nos mais variados lugares. 
Existe uma assessoria de memória e cultura nas Obras Sociais Irmã Dulce que, todos os anos, recebe relatos de pessoas de diversos lugares do país e do mundo, são milhares deles, que ficam reservados em arquivos separados especialmente para essa finalidade. 
Embora os relatos de graças sejam muitos, os devotos são unânimes em afirmar que o maior de todos é totalmente visível: - A obra social - responsável hoje por um terço do atendimento de saúde de toda Salvador, com cerca de quatro mil por dia. Evanildes e outros milhares de devotos são gratos a quem deu todo fôlego em benefício aos mais carentes. 
Um amor perfeito, que se expressa no olhar. Amor que, de tão perfeito, as graças florescem todos os dias do ano. 

terça-feira, 17 de maio de 2011

Vocação: Voz de Deus que ecoa no mundo!


Deus continua chamando. O motivo de seu chamado é o amor: e o caminho de seu agir são os caminhos tortuosos dos corações humanos. Esses corações que tem tantos outros deuses aos quais poderiam se apegar. Deuses do poder, do prestígio, e da influência social. Deuses dos exércitos e do culto à beleza, ao dinheiro e ao prazer. Independente disso, porém, esse Deus tão humano não pára de estabelecer contatos, formular propostas e apresentar projetos. Ele chama as pessoas pelo nome, apresentando-lhes possíveis caminhos e opções fundamentais de vida.

Não existe ser humano que não seja comhecido, amado, chamado por Deus para uma tarefa específica, um carisma especial, um dever pessoal. Deus não uniformiza o seu chamado, mas dirige-se a cada um de maneira bem pessoal e totalmente personalizada.

Renold J. Blank, texto publicado na revista O Cooperador Paulino (maio-agosto de 2004)



sábado, 14 de maio de 2011

ALEGRIA VERDADEIRA!



“As coisas finitas podem trazer felicidade, mas somente o Infinito pode dar a verdadeira alegria”. “É uma questão que atravessa largamente a sociedade e a cultura de hoje. O Evangelho apresenta Jesus como verdade: verdade de Deus e ao mesmo tempo verdade do homem. Como aconteceu com Francisco, também a nós Cristo fala ao coração. Corremos o risco de passar uma vida inteira ensurdecidos por vozes ruidosas mas vazias, corremos o risco de deixar fugir a sua voz, a única que conta, porque é a única que salva.
Papa Bento XVI

O Santo Padre nos fala de vozes ruidosas, mas vazias! Nessa vida temos que aprender a fazer a diferenciação entre as coisas que são Fogos de Fogueira e as que são  Fogos de Artifício.

Fogos de Artifício são muito belos. Coloridos. Iluminam a noite escura. Fazem muito barulho, chamam a atenção de inúmeros espectadores. Mas embora façam um verdadeiro estardalhaço, passam muito rapidamente, e embora iluminem a noite escura, sua iluminação é muito passageira. E depois de pouco tempo, a multidão que antes assistia a queima de fogos logo se esquece até do motivo pelo qual os fogos estouravam no ar.

Já o Fogo de Fogueira é mais discreto, quase que não chama a atenção. Mas em meio a noite fria e escura de pessoas perdidas aquece e protege de animais perigosos, e sua fumaça serve de sinal para pessoas que estão perdidas. É também mais duradouro. E o mais legal é que pode ser partilhado, levado a outros e assim se produzir mais fogueiras par aquecer as noite frias e escuras.

Na nossa vida também há coisas que são fogo de fogueira e de artifício. Podem ser nossa banda ou cantor (a) predileto (a) mas que por mais que gostemos deles (as) passarão. Podem ser pessoas que achamos que são amigas, mas que só fazem muito barulho, até são engraçadas, mas são vazias e não nos acrescentam nada. Quantas coisas em nossa vida fazem muito barulho, chamam a atenção mas são iguais Fogos de Artifício? Vazios, embora sejam belos. Nossos amigos, são fogos de fogueira ou de artifício? Nossos livros, programas de T.V. E eu? Sou fogo de fogueira na vida das pessoas ou de artifício? Me comprometo com a vida das pessoas?

(Fragmento da Hora Santa proposta pelo Papa aos Jovens)

terça-feira, 10 de maio de 2011

Por que rezar pelas vocações?



Para responder a esta pergunta, quero primeiramente tentar explanar o tema da oração. Logo quando pensamos em rezar nos vem à mente alguma prática piedosa de contato com o Transcendente. Alguma novena, algum terço ou outras maneiras de aproximarmo-nos de Deus. Acredito que tudo seja válido. No entanto, a oração é mais que isto.
Os santos muito nos inspiram e ajudam a compreender o que é a oração, já que fizeram verdadeiras experiências de vida oracional. A Doutora da Igreja, Terezinha do Menino Jesus, nos indica que a “oração é um impulso do coração, é um simples olhar lançado ao céu, um grito de reconhecimento e amor no meio da provação ou no meio da alegria”. Já para João Damasceno a oração “é a elevação da alma a Deus ou o pedido a Deus dos bens convenientes”. Santo Agostinho nos ajuda neste tema da oração lembrando que “é o encontro entre a sede de Deus e a nossa. Deus tem sede de que nós tenhamos sede dele”. Ainda mais contemporânea, Chiara Lubich (Fundadora do Movimento dos Focolares) nos insere na realidade da oração indicando “que é diálogo, comunhão, relação intensa de amizade... é escolher Deus como único ideal, como o tudo de nossa vida... é dizer-lhe sinceramente: ‘Meu Deus e meu tudo’; ‘Eu te amo’; ‘Sou inteiramente teu, inteiramente tua’; ‘És Deus, és meu Deus, o nosso Deus de amor infinito!’”
Como vimos, rezar é estabelecer o diálogo sincero. É estar-permanecer-ficar com Deus, assim como se tem vontade de estar com um amigo. Deus é o amigo da humanidade que se compadece, olha com a misericórdia, elevando-nos e indicando a contemplarmos a Sua Vontade.
Se chegamos (com a ajuda das testemunhas do Reino que já contemplaram a face do Cristo, Bom Pastor, Amigo da humanidade) a conclusão de que a oração é o diálogo que mais agrada a Deus, pois nos lança na experiência manifestarmos nossa confiança Nele através de nossos pedidos, de exaltá-Lo pela nossa gratidão e de louvar-reverenciar Aquele que revelou a alegria de conviver e partilhar uma experiência que se estende ao mundo inteiro, pois é pautada na liberdade de abandonar-se e entregar-se unicamente ao nosso Amor Indivisível, então somos convidados a cultivar esta relação que fomos chamados a viver.
No Evangelho de São Mateus, no capítulo 9, versículos 36-38 nos indica o seguinte texto: “Ao ver as multidões, Jesus encheu-se de compaixão por elas, porque estavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor. Então disse aos discípulos: “A colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos. Pedi, pois, ao Senhor da colheita que envie trabalhadores para sua colheita!” Jesus vê a realidade do povo, é movido interiormente pela situação e nos faz um apelo: “Pedi, pois, ao Senhor da colheita...”. Quem ao pedido de um amigo (muito caro) não se colocaria à disposição? Ainda mais sendo algo que podemos (não nos custa) fazer? Se compreendemos a oração como amizade com Deus e este amigo nos faz um pedido, então, mais do que nunca devemos estar atento a corresponder com esta ação de petição.
Aqui já teríamos razão suficiente para fazer de nossa vida uma existência voltada para este pedido do Amigo da Humanidade. Rezar pelas vocações (pelos que virão, pelos que estão respondendo e pelos que já responderam).
Além disso, como não somos inertes no mundo, percebemos a plena realidade que nos circunda. Mediante a tantos apelos que nos provocam reconhecemos que nosso povo ainda “caminha como ovelhas sem pastor” (Mc 6,30) e que sedento busca a “fonte de água viva” (Jo 4,10). Hoje temos pessoas que avaliando e percebendo o testemunho que quem já provou desta água também quer experimentar “a água que se tornou dentro dele (vocacionado) fonte que jorra para a vida eterna” (Jo 4, 14), pois a vida se transforma, toma nova dimensão, novo caminho, novo rumo. Encontramos a via: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6), e nos aproximamos daquele que é o modelo no seguimento. Configuramo-nos a Ele, queremos ser e viver Nele.
Meditante a necessidade de mais pessoas autênticas em viver a proposta do Reino, pessoas que sejam capazes testemunhar a Vida, de entregar e configura-se, anunciando o “Novo Céu e a nova Terra” (Ap 21,1), é que rezamos pedindo pelas vocações. Lembrando que o Batismo nos abre para a proposta vocacional, pedimos por todos, para que nossa Igreja seja mais comprometida. Para que nossas comunidades sejam um reflexo do Amor de Deus. Para que o mundo seja uma fonte de esperança. E, para que, sejamos abertos, disponíveis e prontos na nossa resposta generosa ao diálogo de Amor que Deus estabelece com o ser humano, pois a vocação é justamente este diálogo.
Assim, a necessidade de se rezar pelas vocações é um cumprimento evangélico e um olhar atento à realidade.
“Amigo da Humanidade, vós sois o Cristo, o Bom Pastor! Tomai-nos ao vosso serviço, nós que vimos a verdadeira luz” (CD Luz da Luz – faixa 16 – Frei José Moacyr Cadenassi).
Que Jesus seja nossa inspiração para pedirmos ao Pai pessoas que estejam dispostas a assumir o Reino com sua vida, pois “a messe é grande e os trabalhadores são poucos”.


Pe. Valdecir Ferreira
Assessor PV/SAV – Regional Sul 2

domingo, 8 de maio de 2011

Uma semente que cresce



"Esta é a nossa missão: fazer conhecer, fazer amar, fazer cumprir a doutrina de Jesus Cristo" (São José Marello)

Nós irmãs Oblatas de São José estamos em festa, pois 6 de nossas irmãs estiveram em Roma se preparando para a Profissão Perpétua. Foi um tempo rico de encontro espiritual, de visita cultural e de convivencia. Com um aprofundamento ao carisma Josefino-marelliano e uma experiencia internacional, já que das seis irmãs que fizeram a profissão, três são  Brasileiras Irmã Roseli, irma Silmara e Irmã Valéria, duas são italianas Irmã Elisa e irmã Rosangela e uma Peruana Irmã Cecilia.
Foi um momento de muita alegria para toda a congregação das irmãs Oblatas, sendo a primeira vez que seis irmãs de três nações faz a profissão perpétua juntas.
A Profissão perpétua foi realizada no dia 7 de maio em Asti na Italia, na paroquia-santuario de São José, casa mãe da Congregação dos Oblatos de São José. foi uma grande graça, pois estamos celebrando a festa dos 10 anos de canonização de  São José Marello nosso pai espiritual.


terça-feira, 3 de maio de 2011

Nossa meta é...



Todos nós somos filhos de Deus, e, por assim ser, somos chamados a participar do plano salvífico e da promessa da vida eterna. É devido a isso que temos um projeto de vida e, com esse projeto, um objetivo, Um ideal para uma vida toda que nos move e dá sentido a existência.

  Podemos alcançar o ideal almejado levando a vida de maneira simples, porém, com muita intensidade, o importante é estar atento e compreender que os nossos objetivos só estarão fundamentados se tiverem um motivo, uma razão que nos impulsione, que faça realmente com que não desistamos de caminhar sem perder o intuito final.

Um parêntese aqui se faz necessário, e uma pergunta nasce: Qual é o motivo do nosso caminhar? Supostas respostas podem surgir, no entanto, uma única palavra pode sintetizar a resposta para essa pergunta, e ela é: JESUS.

Se o ideal de vida que possuo não estiver ancorado em Jesus, então nunca chegarei ao final de trajeto, caminharei sem rumo correndo o risco de me perder e ficar cansado. Contudo, se percebo, e de fato assumo, que o objetivo e razão do meu caminhar deve estar firmado em Cristo, então eu trafegarei pelos caminhos mais longínquos, e passarei pelo mais variados obstáculos e no final alcançarei a meta, percebendo que tudo só foi possível porque Ele esteve ao meu lado desde o início!

Caríssimos amigos, percebamos que Cristo é o motivo pela qual caminhamos, percebamos que mais do que o objetivo Ele também é o farol que sinaliza a direção na qual devemos caminhar, e sem sua presença não há esperança.

Coloquemos desde já Jesus como maior objetivo de nossas vidas, e todos os outros conseguiremos alcançar!

Tenha um Dia Abençoado!!!

Texto: Seminarista Gabriel Calvi
Diocese de Apucarana

Vídeo / Contigo é bem melhor - Adriana

domingo, 1 de maio de 2011

Bento XVI na Beatificação de João Paulo II


Amados irmãos e irmãs,
passaram já seis anos desde o dia em que nos encontrávamos nesta Praça para celebrar o funeral do Papa João Paulo II. Então, se a tristeza pela sua perda era profunda, maior ainda se revelava a sensação de que uma graça imensa envolvia Roma e o mundo inteiro: graça esta, que era como que o fruto da vida inteira do meu amado Predecessor, especialmente do seu testemunho no sofrimento. Já naquele dia sentíamos pairar o perfume da sua santidade, tendo o Povo de Deus manifestado de muitas maneiras a sua veneração por ele. Por isso, quis que a sua Causa de Beatificação pudesse, no devido respeito pelas normas da Igreja, prosseguir com discreta celeridade. E o dia esperado chegou! Chegou depressa, porque assim aprouve ao Senhor: João Paulo II é Beato!
Desejo dirigir a minha cordial saudação a todos vós que, nesta circunstância feliz, vos reunistes, tão numerosos, aqui em Roma vindos de todos os cantos do mundo: cardeais, patriarcas das Igrejas Católicas Orientais, irmãos no episcopado e no sacerdócio, delegações oficiais, embaixadores e autoridades, pessoas consagradas e fiéis leigos; esta minha saudação estende-se também a quantos estão unidos conosco através do rádio e da televisão.
Estamos no segundo domingo de Páscoa, que o Beato João Paulo II quis intitular Domingo da Divina Misericórdia. Por isso, se escolhi esta data para a presente celebração, foi porque o meu Predecessor, por um desígnio providencial, entregou o seu espírito a Deus justamente ao anoitecer da vigília de tal ocorrência. Além disso, hoje tem início o mês de Maio, o mês de Maria; e neste dia celebra-se também a memória de São José operário. Todos estes elementos concorrem para enriquecer a nossa oração; servem-nos de ajuda, a nós que ainda peregrinamos no tempo e no espaço; no Céu, a festa entre os Anjos e os Santos é muito diferente! E todavia Deus é um só, e um só é Cristo Senhor que, como uma ponte, une a terra e o Céu, e neste momento sentimo-lo muito perto, sentimo-nos quase participantes da liturgia celeste.
"Felizes os que acreditam sem terem visto" (Jo 20, 29). No Evangelho de hoje, Jesus pronuncia esta bem-aventurança: a bem-aventurança da fé. Ela chama de modo particular a nossa atenção, porque estamos reunidos justamente para celebrar uma Beatificação e, mais ainda, porque o Beato hoje proclamado é um Papa, um Sucessor de Pedro, chamado a confirmar os irmãos na fé. João Paulo II é Beato pela sua forte e generosa fé apostólica. E isto traz imediatamente à memória outra bem-aventurança: "Feliz de ti, Simão, filho de Jonas, porque não foram a carne e o sangue que to revelaram, mas sim meu Pai que está nos Céus" (Mt 16, 17). O que é que o Pai celeste revelou a Simão? Que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus vivo. Por esta fé, Simão se torna "Pedro", rocha sobre a qual Jesus pode edificar a sua Igreja. A bem-aventurança eterna de João Paulo II, que a Igreja tem a alegria de proclamar hoje, está inteiramente contida nestas palavras de Cristo: "Feliz de ti, Simão" e "felizes os que acreditam sem terem visto". É a bem-aventurança da fé, cujo dom também João Paulo II recebeu de Deus Pai para a edificação da Igreja de Cristo.
Entretanto perpassa pelo nosso pensamento mais uma bem-aventurança que, no Evangelho, precede todas as outras. É a bem-aventurança da Virgem Maria, a Mãe do Redentor. A Ela, que acabava de conceber Jesus no seu ventre, diz Santa Isabel: "Bem-aventurada aquela que acreditou no cumprimento de tudo quanto lhe foi dito da parte do Senhor" (Lc 1, 45). A bem-aventurança da fé tem o seu modelo em Maria, pelo que a todos nos enche de alegria o fato de a beatificação de João Paulo II ter lugar no primeiro dia deste mês mariano, sob o olhar materno d’Aquela que, com a sua fé, sustentou a fé dos Apóstolos e não cessa de sustentar a fé dos seus sucessores, especialmente de quantos são chamados a sentar-se na cátedra de Pedro. Nas narrações da ressurreição de Cristo, Maria não aparece, mas a sua presença pressente-se em toda a parte: é a Mãe, a quem Jesus confiou cada um dos discípulos e toda a comunidade. De forma particular, notamos que a presença real e materna de Maria aparece assinalada por São João e São Lucas nos contextos que precedem tanto o Evangelho como a primeira Leitura de hoje: na narração da morte de Jesus, onde Maria aparece aos pés da Cruz (Jo 19, 25); e, no começo dos Atos dos Apóstolos, que a apresentam no meio dos discípulos reunidos em oração no Cenáculo (Act 1, 14).
Queridos irmãos e irmãs, hoje diante dos nossos olhos brilha, na plena luz de Cristo ressuscitado, a amada e venerada figura de João Paulo II. Hoje, o seu nome junta-se à série dos Santos e Beatos que ele mesmo proclamou durante os seus quase 27 anos de pontificado, lembrando com vigor a vocação universal à medida alta da vida cristã, à santidade, como afirma a Constituição conciliar Lumem gentium sobre a Igreja. Os membros do Povo de Deus – bispos, sacerdotes, diáconos, fiéis leigos, religiosos e religiosas – todos nós estamos a caminho da Pátria celeste, tendo-nos precedido a Virgem Maria, associada de modo singular e perfeito ao mistério de Cristo e da Igreja. Karol Wojtyła, primeiro como Bispo Auxiliar e depois como Arcebispo de Cracóvia, participou no Concílio Vaticano II e bem sabia que dedicar a Maria o último capítulo da Constituição sobre a Igreja significava colocar a Mãe do Redentor como imagem e modelo de santidade para todo o cristão e para a Igreja inteira. Foi esta visão teológica que o Beato João Paulo II descobriu na sua juventude, tendo-a depois conservado e aprofundado durante toda a vida; uma visão, que se resume no ícone bíblico de Cristo crucificado com Maria ao pé da Cruz. Um ícone que se encontra no Evangelho de João (19, 25-27) e está sintetizado nas armas episcopais e, depois, papais de Karol Wojtyła: uma cruz de ouro, um "M" na parte inferior direita e o lema "Totus tuus", que corresponde à conhecida frase de São Luís Maria Grignion de Monfort, na qual Karol Wojtyła encontrou um princípio fundamental para a sua vida: "Totus tuus ego sum et omnia mea tua sunt. Accipio Te in mea omnia. Praebe mihi cor tuum, Maria – Sou todo vosso e tudo o que possuo é vosso. Tomo-vos como toda a minha riqueza. Dai-me o vosso coração, ó Maria" (Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, n. 266).
No seu Testamento, o novo Beato deixou escrito: "Quando, no dia 16 de Outubro de 1978, o conclave dos cardeais escolheu João Paulo II, o Card. Stefan Wyszyński, Primaz da Polónia, disse-me: 'A missão do novo Papa será a de introduzir a Igreja no Terceiro Milênio'". E acrescenta: "Desejo mais uma vez agradecer ao Espírito Santo pelo grande dom do Concílio Vaticano II, do qual me sinto devedor, juntamente com toda a Igreja e sobretudo o episcopado. Estou convencido de que será concedido ainda por muito tempo, às sucessivas gerações, haurir das riquezas que este Concílio do século XX nos prodigalizou. Como Bispo que participou no evento conciliar, desde o primeiro ao último dia, desejo confiar este grande patrimônio a todos aqueles que são, e serão, chamados a realizá-lo. Pela minha parte, agradeço ao Pastor eterno que me permitiu servir esta grandíssima causa ao longo de todos os anos do meu pontificado". E qual é esta causa? É a mesma que João Paulo II enunciou na sua primeira Missa solene, na Praça de São Pedro, com estas palavras memoráveis: "Não tenhais medo! Abri, melhor, escancarai as portas a Cristo!". Aquilo que o Papa recém-eleito pedia a todos, começou, ele mesmo, a fazê-lo: abriu a Cristo a sociedade, a cultura, os sistemas políticos e econômicos, invertendo, com a força de um gigante – força que lhe vinha de Deus –, uma tendência que parecia irreversível. Com o seu testemunho de fé, de amor e de coragem apostólica, acompanhado por uma grande sensibilidade humana, este filho exemplar da Nação Polaca ajudou os cristãos de todo o mundo a não ter medo de se dizerem cristãos, de pertencerem à Igreja, de falarem do Evangelho. Numa palavra, ajudou-nos a não ter medo da verdade, porque a verdade é garantia de liberdade. Sintetizando ainda mais: deu-nos novamente a força de crer em Cristo, porque Cristo é o Redentor do homem –Redemptor hominis: foi este o tema da sua primeira Encíclica e o fio condutor de todas as outras.
Karol Wojtyła subiu ao sólio de Pedro trazendo consigo a sua reflexão profunda sobre a confrontação entre o marxismo e o cristianismo, centrada no homem. A sua mensagem foi esta: o homem é o caminho da Igreja, e Cristo é o caminho do homem. Com esta mensagem, que é a grande herança do Concílio Vaticano II e do seu "timoneiro" – o Servo de Deus Papa Paulo VI –, João Paulo II foi o guia do Povo de Deus ao cruzar o limiar do Terceiro Milênio, que ele pôde, justamente graças a Cristo, chamar "limiar da esperança". Na verdade, através do longo caminho de preparação para o Grande Jubileu, ele conferiu ao cristianismo uma renovada orientação para o futuro, o futuro de Deus, que é transcendente relativamente à história, mas incide na história. Aquela carga de esperança que de certo modo fora cedida ao marxismo e à ideologia do progresso, João Paulo II legitimamente reivindicou-a para o cristianismo, restituindo-lhe a fisionomia autêntica da esperança, que se deve viver na história com um espírito de "advento", numa existência pessoal e comunitária orientada para Cristo, plenitude do homem e realização das suas expectativas de justiça e de paz.
Por fim, quero agradecer a Deus também a experiência de colaboração pessoal que me concedeu ter longamente com o Beato Papa João Paulo II. Se antes já tinha tido possibilidades de o conhecer e estimar, desde 1982, quando me chamou a Roma como Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, pude durante 23 anos permanecer junto dele crescendo sempre mais a minha veneração pela sua pessoa. O meu serviço foi sustentado pela sua profundidade espiritual, pela riqueza das suas intuições. Sempre me impressionou e edificou o exemplo da sua oração: entranhava-se no encontro com Deus, inclusive no meio das mais variadas incumbências do seu ministério. E, depois, impressionou-me o seu testemunho no sofrimento: pouco a pouco o Senhor foi-o despojando de tudo, mas permaneceu sempre uma "rocha", como Cristo o quis. A sua humildade profunda, enraizada na união íntima com Cristo, permitiu-lhe continuar a guiar a Igreja e a dar ao mundo uma mensagem ainda mais eloquente, justamente no período em que as forças físicas definhavam. Assim, realizou de maneira extraordinária a vocação de todo o sacerdote e bispo: tornar-se um só com aquele Jesus que diariamente recebe e oferece na Eucaristia.
Feliz és tu, amado Papa João Paulo II, porque acreditaste! Continua do Céu – nós te pedimos – a sustentar a fé do Povo de Deus. Amém.


HOMILIA DO PAPA BENTO XVI POR OCASIÃO DA
 BEATIFICAÇÃO DE JOÃO PAULO II