segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O paradoxo da santidade


Por: Maddalena Maltese, Mariagrazia Baroni

Normalmente, quando se fala de santos, o nosso imaginário leva-nos logo a procissões, velas e imagens. A devoção de alguns viaja em paralelo ao ceticismo e à indiferença de muitos porque, aparentemente, a santidade tem pouco a dizer hoje. Mas em relação a Chiara Luce a coisa é diferente. A internet está cheia de registros sobre ela: vídeos no Youtube, músicas, fotos, chats. Ela tem até um perfil no facebook. Sobre o seu túmulo, abundam mensagens e presentes coloridos de jovens, crianças e adultos. Ela poderia ser aquela colega de classe, aquela amiga simpática da excursão, aquela amiga do coração que, num determinado dia, foi tragicamente separada de nós.

  No entanto, como alguém declarou, "foi a normalidade de sua vida que lhe fez merecer os altares". Sobre essa garota de 18 anos ? reprovada uma vez na escola, apaixonada por tênis, que viveu entre as suspensões e os sonhos de uma adolescente, morta por um câncer ? agnósticos e pessoas de fé escreveram livros, vaticanistas escreveram páginas de blogs e, em breve, sairão um documentário e um filme. 

  Alguns representantes da cultura contemporânea italiana? Uma diretora de cinema, um escritor agnóstico e um jornalista ? dão as suas opiniões sobre o fenômeno Chiara Badano.

              A surpresa
  "Pensava que ia contar uma história do passado mas, pesquisando sobre Chiara Luce no Google, encontrei relatos de muitos jovens que se dirigiam a ela para lhe pedir uma cura, mas isto no sentido de lhe pedir força para serem coerentes; eu diria que pediam uma cura humana e espiritual. Foi uma surpresa que me deixou chocada. 

  A realização do documentário sobre ela não foi simples. O material disponível era muito escasso, as fotos tinham pouca qualidade e, depois, não havia fatos heróicos: era uma vida normal demais. Porém, eu não queria fazer uma ficção. Eu deixei que Chiara Luce e as pessoas que tinham convivido com ela falassem. Diversas testemunhas: pais, amigos, médicos e pessoas que nunca a tinham visto, mas cujo exemplo tinha mudado as suas vidas. 

  Para as tomadas, escolhi um departamento de tratamento de câncer pediátrico, onde era inevitável identificar-se com as histórias de dor que eram vividas alí dia após dia, e imaginar como tinha sido a experiência de Chiara Luce.

  Ela soube dar um sentido ao sofrimento e à vida. Uma garota frágil, consumida pela doença? e que procura descobrir, por trás de tudo, um esplêndido desígnio muda, indubitavelmente, a perspectiva de nossa vida. “Até mesmo os funcionários da gravadora, acostumados com grandes emoções, estavam com os olhos marejados”.

Maria Amata Calò, que dirigiu o documentário "Um desígnio esplêndido" sobre Chiara Luce

   O oposto da retórica
  "Acredito que Chiara Luce seja o protótipo perfeito da santa moderna. A história dela e antes ainda de sua doença demonstra a todos, inclusive a quem não possui um referencial religioso, que também uma pessoa absolutamente normal pode chegar a viver uma vida tão extraordinária. 

  Chiara fascina por um monte de razões: pela simplicidade, pela leveza, pela sua coerência e determinação com as quais ela soube dar consistência às suas escolhas. A sua visão da vida era o oposto da retórica e da tagarelice. O seu amor por Deus e pelo próximo era manifestado em pouquíssimas palavras e em muitíssimos gestos: praticamente o oposto daquilo que, todos os dias, nós somos obrigados a absorver da TV e de muitos ?convincentes? mestres de pensamento."

Franz Coriasco, escritor agnóstico, que escreveu a última biografia de Chiara Luce "Dai tetti in giù" (Dos telhados para baixo)

Choque positivo   
  "A santidade tem algo a dizer a todos os homens de hoje. Depois do Evangelho, os santos são a única mensagem cristã que realmente ?chega? às pessoas. Mas nós cristãos não sabemos repassá-la. Assumimos posições moralistas, e o mundo boceja diante dessas Mensagens. 

  Os responsáveis pela mídia consideram o cristianismo algo enfadonho, mas o fato é que, se ele for verdadeiro, é uma mensagem de fogo. Trata-se de um preconceito laicista e de uma preguiça cultural. São os nossos meios de comunicação que são enfadonhos. 

  A humanidade de hoje tem uma grande necessidade de socos no estômago que os santos sabem dar. Se eu fosse um diretor de cinema, eu daria o personagem Maximiliano Kolbe a Roberto Begnini; atribuiria o personagem de Raoul Follereau a Antonio Albanese e pediria a Paola Turci para interpretar uma canção sobre Chiara Luce. 

  Se a mídia tivesse sido rápida em apresentar o dom que Chiara Badano teve em olhar a irmã morte de frente, teria causado um choque positivo nos jovens, que fazem parte de uma geração que, inconscientemente, joga o tempo todo com a morte.

Luigino Accattoli, jornalista e vaticanista do jornal italiano Corriere della Sera

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